Bichos-da-seda biônicos para a indústria farmacêutica
Inspirados pela natureza, cientistas ingleses desenvolvem uma técnica para tecer fios, formando minúsculos casulos. Eles servem para embalar moléculas que, de outras maneiras, se degradariam. Aplicações vão da indústria alimentícia à farmacêutica.
Nanocasulo desenvolvido artificialmente pela Universidade de Oxford: estudo sugere que tecnologia pode ser usada na produção de medicamentos
Um grupo de pesquisadores da Universidade de Oxford desenvolveu versões microscópicas dos casulos produzidos por bichos-da-seda. As minúsculas cápsulas, que são invisíveis a olho nu, podem proteger materiais biomoleculares sensíveis, além de fornecerem matéria-prima para inovações tecnológicas em áreas como ciência alimentar, biotecnologia e fármacos.
Os nanocasulos foram feitos usando um processo de microengenharia especialmente desenvolvido para essa pesquisa. O processo imita, em microescala, a maneira como os bichos-da-seda da espécie Bombyx mori giram os casulos dos quais a seda natural é colhida. As cápsulas resultantes têm uma camada sólida e dura de nanofibrilas de seda, que envolvem e protegem um núcleo líquido, e são mais de mil vezes menores que as criadas pelos insetos.
Em um artigo na revista Nature Communications, os cientistas sugerem que esses microcasulos são uma solução em potencial para um problema tecnológico comum: como proteger moléculas sensíveis que possuem benefícios nutricionais ou para a saúde, mas que podem facilmente se degradar e perder essas qualidades durante o armazenamento ou o processamento. Segundo os pesquisadores, a solução é embalar as substâncias em camadas de seda, capazes de abrigar pequenas partículas na fabricação de vários produtos, desde cosméticos a alimentos.
A mesma tecnologia poderia ser aplicada na produção de medicamentos que tratam uma ampla gama de doenças graves e debilitantes. No estudo, os pesquisadores mostraram, com sucesso, que os microcasulos de seda podem aumentar a estabilidade e a duração de um anticorpo que atua sobre uma proteína associada a doenças neurodegenerativas.
“Em uma variedade de áreas, existem moléculas ativas com propriedades benéficas. Mas o desafio é conseguirmos estabilizá-las para armazenamento”, diz Tuomas Knowles, pesquisador da Universidade de Oxford e principal autor do trabalho. “Uma solução conceitualmente simples, mas extremamente eficaz, é colocar essas moléculas dentro de pequenas cápsulas. Tais cápsulas são feitas, normalmente, de polímeros sintéticos, o que pode ter uma série de inconvenientes. Recentemente, exploramos o uso de materiais totalmente naturais para esse propósito. Existe potencial para substituir os plásticos com biomateriais sustentáveis, como a seda, para esse fim”, explica.
“A seda natural já é usada em produtos como materiais cirúrgicos, então, sabemos que é segura para uso humano”, conta Fritz Vollrath, também da Universidade de Oxford e coautor do estudo. “E o mais importante é que a nossa abordagem não altera o material, apenas sua forma”, afirma. Chris Holland, chefe do Grupo de Materiais Naturais da Universidade de Sheffield, acrescenta: “A seda é surpreendente, porque, enquanto ela é armazenada como um líquido, o processo de fiação a transforma em um sólido”.
Tratamentos
Os microcasulos podem aumentar a vida útil das proteínas e das moléculas destinadas ao uso farmacêutico. Uma vez que a tecnologia tem a capacidade de preservar anticorpos que, de outra forma, se degradariam, eles permitiriam o desenvolvimento de novos tratamentos contra o câncer, ou voltados a condições neurodegenerativas, como doenças de Alzheimer e Parkinson.
Para explorar a viabilidade das microcápsulas de seda nessa aplicação, os pesquisadores as testaram, com sucesso, com um anticorpo desenvolvido para atuar na alfa-sinucleína, proteína que se pensa estar associada ao início do processo molecular que leva à doença de Parkinson. “Algumas das estratégias terapêuticas mais eficazes são os anticorpos. Porém, eles tendem a não se manter estáveis nas altas concentrações necessárias para o uso médico. Ao introduzi-los nos microcasulos como o fizemos, conseguimos não só estender sua longevidade, mas ampliar a gama de anticorpos à nossa disposição. Estamos muito empolgados com as possibilidades de usar esse novo material”, conclui Tuomas Knowles.
“A seda natural já é usada em produtos como materiaiscirúrgicos, então, sabemos que é segura para uso humano”
Fritz Vollrath,
pesquisador da Universidade de Oxford e coautor do estudo